Por Warwick
Mota
Em O Evangelho segundo o
Espiritismo, o Espírito Hahnemann faz-nos o seguinte alerta, bastante
significativo, acerca do nosso comportamento na Terra: “O corpo não dá cólera
àquele que não na tem, do mesmo modo que não dá os outros vícios” (1).
Exatamente aquele que foi, em vida, considerado “o pai da Homeopatia”, Samuel
Hahnemann retorna, como Espírito, para nos desvelar a submissão da matéria, na
comparação com aquilo que é espiritual.
Ou seja: a Doutrina Espírita vem revelar que, no centro de
todas as manifestações, está o Espírito.
No entanto, por suas persistentes
fraquezas, por seu comportamento indômito, pelo temperamento indomado, o homem muitas
vezes tenta, em vão, atribuir a culpa dos seus erros à matéria, buscando
também, equivocadamente, adquirir a suposta remissão por meio do sofrimento
físico, associando sofrimento físico a redenção.
Trata-se de ênfase dada à
matéria de maneira equivocada, conquanto também possa ser traduzida em
oportunidade para reflexão.
Imaginemos um indivíduo que
tenha cometido um erro grave, como o adultério.
É permitido a esse ser humano
atribuir a culpabilidade de seu erro à linhagem genética de onde proveio?
Logicamente que isso soa até pueril, pois não são os
caracteres genéticos que induzem uma pessoa ao erro, mas sua condição moral.
Nossos erros não provêm de dada condição orgânica, nem nosso temperamento.
Inclusive porque, de maneira positivada, o que às vezes pode
ser geneticamente explicado nem sempre poderá ser moralmente aceito: a ninguém
é dado alegar que tem um gênio difícil, simplesmente porque herdou essa condição
infeliz dos genitores.
Em nosso processo educativo
espiritual, o aspecto emocional vai sendo, pouco a pouco, modulado, na usina
das relações sociais, nas oportunidades de intercâmbio, nas reencarnações, na
troca do amor, na troca dos sentimentos.
Assim também é que o temperamento
humano bilioso cede, a partir da caminhada evolutiva, dando lugar a pessoas
compreensivas, fleumáticas e de índoles mais pacíficas.
Todo esse processo não acontece
num átimo, do dia para a noite, é certo. Desenrola-se ao longo de várias
reencarnações.
Partimos de reações
estapafúrdias, eivadas de ira, ciúme, e de vários sentimentos exacerbados, animalizados,
para a noção do dever corretamente cumprido e da conduta socialmente aceita.
O importante é reconhecermos as
dificuldades das nossas emoções deseducadas, do temperamento difícil que
apresentamos, para a convivência social, e aceitarmos que precisamos nos
modificar.
O que não dá é para aceitarmos,
como verdade, para nós, o que, curiosamente, ouve-se chamar da “síndrome da
Gabriela”, a personagem que parece, na canção, não estar disposta a alterar
suas atitudes: “eu nasci assim, eu cresci assim, eu sou mesmo assim, vou ser
sempre assim...” (2).
O que também não é possível é buscar-se
ocultar a dificuldade moral em presumível condição orgânica, falácia que, ao
espírita, já não cabe, porquanto sabemos que o pensamento é o nosso motor
atitudinal.
Somos guiados pelos nossos
pensamentos, que devem ser educados a partir da nossa própria sanção moral
amadurecida.
Pensamento educado impede-nos
de exteriorizar atos e comportamentos errôneos, e, ainda mais, de nos
consorciarmos, por questões de sintonia, com a espiritualidade menos feliz, o
que sempre capitaliza maus pendores.
É a partir da educação dos
nossos sentimentos e pensamentos que nos tornamos capazes de cercear os
excessos, quer estes se traduzam no temperamento detestável, quer se traduzam
nas atitudes cotidianas indesejáveis.
Não é a matéria que define
nosso comportamento, mas, na verdade, são nossos vícios ou virtudes morais que
determinam nossa conduta, no campo físico.
Viciamo-nos em atitudes
violentas, em temperamentos coléricos que ainda nos remetem a nossa estrutura
ancestral primitiva, mas essas atitudes intempestivas precisam ser domadas em
nós, que já guardamos algum conhecimento espiritual, porque conhecimento também
traz consigo a responsabilidade da mudança para melhor.
Se é para se afirmar que se
herdou algo dos ancestrais, que se busque o que eles tiveram ou manifestaram de
melhor: se tinham valores, se respeitavam a vida, herdemos essas
características imaterias, intangíveis, mas substanciais para a evolução
planetária.
Quando damos espaço para
temperamentos virulentos, para comportamentos agressivos, para atitudes
insanas, estamos dando mostras de que a noção de amor ao próximo, perfeitamente
exemplificada por Jesus, ainda não está sedimentada em nosso coração, ou,
talvez, sequer tenha chegado a ele.
A lição do Mestre é uma lição
de paz.
Vejamos que até a atuação de
Pedro, quando ele toma da espada e decepa a orelha do soldado, assim agindo
para proteger o seu Mestre (3), Jesus corrige, explicando que não é assim que
se deve agir na Terra.
Embora tão próximo a Jesus – Este
todo amor, todo bondade, todo paz - ainda assim Pedro cometeu esse deslize,
levado pelas circunstâncias que, quiçá, pareceram-lhe fora de controle.
Se com ele assim aconteceu, e
quanto a nós?!
Vamos colocar a luz da
responsabilidade, para nos auto-analisarmos e nos consertarmos, em primeiro
lugar.
Libertos de nossos
comportamentos antiéticos, amorais, cristalizados, avançaremos em sentimentos
de paz, de alegria, inundando-nos, e aos que convivem conosco, de energias
saudáveis.
Em dias difíceis, olhe para o
lado e sorria, dê um sorriso, o riso quebra a propensão à atitude ruim, ao
temperamento aguerrido, à tentativa de revolta, é bom e nada custa.
Aprendamos com as crianças:
nada melhor que o sorriso de um filho, para minar, em nós, o cansaço, a mágoa,
o mau temperamento.
Deixemo-nos contagiar pelas
boas energias, extraindo, do contato social, a oportunidade de educarmos nossos
sentimentos; temperarmos nosso temperamento; e modularmos, para melhor, nossas
sensações, nossas ações, nossos sentimentos.
Com o tempo, conquistaremos a
paz.
Publicado no em o Reformador - agosto 2017
Referências:
1) KARDEC,
Allan. O Evangelho segundo o Espiritismo. 131ª. ed., Brasília: FEB, 2014, Capítulo
IX, p. 140.
2) Gabriela.
Música de Dorival Caymmi. Disponível em https://www.letras.mus.br/dorival-caymmi/356571/.
Acesso em 2016-20-12.
3) Mateus, 26:52